segunda-feira, 27 de junho de 2011

Aprendendo com Joanna de Ângelis – Parte Final

Aprendendo com Joanna de Ângelis – Parte Final

O texto a seguir conclui o estudo sobre a Veneranda Joanna de Ângelis, sua peregrinação pela Terra e as lições que proporcionou com sua vida dedicada à Causa do Bem.

Que a vida desse Nobre Espírito possa iluminar a nossa vida e auxiliar na nossa transcendência em direção à Deus.

Boa leitura!

Aprendendo com Joanna de Ângelis – Parte Final
Renato Costa

Junto a Francisco de Assis

Em uma das idas de Divaldo à Itália Joanna lhe revelou por palavras e emoções uma ligação fortíssima com Francisco de Assis (1182-1226), sem ter, contudo informado quem fora. Francisco de Assis é, também, um tema muito usado por Joanna em seus escritos, em palestras ou workshops, sempre através da abençoada mediunidade de Divaldo Franco, fato que reforça a impressão de que há entre os dois iluminados Espíritos um elo muito grande. Como as seguidoras de Francisco eram dirigidas por Clara de Assis (1193-1252), é certo que Joanna teria sido, naquela vida, uma irmã Clarissa bastante próxima ao pobrezinho de Assis ou, quem sabe, talvez, a própria Clara.

Joana Angélica de Jesus

A 11 de dezembro de 1761, isto é, há exatamente 242 anos, nasceu na cidade de Salvador Joana Angélica, filha de uma abastada família. Ingressou aos 21 anos no Convento da Lapa, naquela cidade. No ano de 1783, professou como irmã Joanna Angélica de Jesus, das Religiosas Reformadas de Nossa Senhora da Conceição. No Convento da Lapa foi vigária, exercendo diversos cargos burocráticos na comunidade, entre os anos de 1798 e 1801. Em 1809 foi conduzida ao posto de conselheira, retornando ao vicariato em 1811. Eleita Abadessa em 1814, permaneceu no cargo até 1817. Três anos após foi reeleita Abadessa, função que exercia por ocasião de sua morte.

Em agosto de 1820 ocorreu a chamada Revolução Liberal do Porto, assumindo o poder uma junta provisória, que convocou as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes e forçou Dom João VI a retornar a Portugal. As Cortes reunidas em Lisboa dissolveram o reino do Brasil e forçaram Dom João a jurar uma nova Constituição, cancelando todos os cargos públicos que haviam sido criados no Brasil e fazendo antever aos brasileiros o retorno à situação de colônia, que eles não mais estavam dispostos a suportar.

Então, a insubordinação explodiu, com os brasileiros não aceitando as ordens dos oficiais portugueses, e estes se recusando a aceitar as ordens do príncipe-regente Dom Pedro, pois as Cortes de Lisboa já lhe haviam anulado esse cargo e exigido seu retorno a Portugal.

A população da Bahia dividiu-se e os conflitos entre brasileiros e portugueses aumentaram. Quando as Cortes Portuguesas nomearam o general português, Madeira de Melo para governar a província, a violência aumentou. A partir de 14 de fevereiro de 1822, Salvador se tornou um grande campo de batalha, com brasileiros e portugueses buscando controlar pontos estratégicos a fim de dominar a cidade.

Em 19 de fevereiro de 1822, os portugueses atacaram o Forte São Pedro, em Salvador. Na manhã seguinte, investiram contra o Convento da Lapa, suspeitando que lá eram escondidos brasileiros libertários. Postando-se, corajosamente, à entrada do Convento, com a cruz em suas mãos, a Abadessa Joana Angélica resistiu à investida dos homens armados, dizendo, segundo registra nossa História:
“Para trás, bárbaros. Respeitem a casa de Deus. Ninguém entrará no convento, a menos que passe por cima de meu cadáver!"

Uma baioneta atravessou, então, o peito da destemida Abadessa que, com seu gesto, não só dera tempo para que as irmãs e demais brasileiros que estavam no Convento escapassem, como fez-se alçada para as páginas de nossa História como símbolo de resistência à opressão e mártir da Independência. Era o dia 20 de fevereiro de 1822.
Após cinco dias de combate, os portugueses anunciaram o controle de Salvador, enquanto os brasileiros comandados por Manuel Pedro se refugiaram na região do Recôncavo Baiano.

A independência de Salvador do domínio português viria somente em 2 de julho de 1823 quando o general Madeira de Melo se rendeu depois de demorado cerco da cidade pelas tropas mandadas por Dom Pedro I, chefiadas pelo francês General Labatut e pelo inglês Almirante Cochrane.

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Temos uma interessante lição a comentar. Após o brilho da personalidade de Sóror Juana Inés de la Cruz, Joanna reencarnou com discrição. São poucas as referências disponíveis sobre a vida da heroína de nossa Independência. Nos livros de História, apenas o evento final de sua vida é contado. Somente agora em nosso século estudos têm sido feitos por pesquisadores da UFBA sobre os escritos de Joana Angélica durante o tempo em que esteve como escrivã do Convento da Lapa e, mais tarde, como Abadessa. Tais estudos, no entanto, ainda carecem de maior divulgação e por muito tempo talvez assim permaneçam.

Joanna nos ensinou que um Espírito evoluído não deve aspirar ao reconhecimento e à fama. Se Sóror Juana brilhou como estrela de primeira grandeza no panorama cultural do século XVII, tal não se deu porque buscava a fama ou o reconhecimento alheio. Brilhou por fora porque já era brilhante por dentro e, na busca do saber, não poupou esforços, a todos causando admiração pelos resultados que obtinha ao perseguir o seu intento. No entanto, ao perceber, pela reação negativa que sofreu, que a fama que havia adquirido não lhe convinha, de pronto a tudo renunciou, encolhendo-se aos olhos dos homens e agigantando-se aos olhos de Deus no serviço anônimo de amparo fraterno.

Quando voltou, no século seguinte, reencarnando na Bahia, elegeu desde cedo a discrição, sem, contudo, abandonar a busca pelo saber, a coragem, o amor aos seus irmãos e todos os demais atributos que, Espírito evoluído, já havia conquistado.

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Temos mais, sem dúvida, a aprender da vida de Joana Angélica. É algo, contudo, que faremos mais adiante.

De São Damião à Lapa: Um Interessante Paralelo

Uma ocasião, no ano de 1234, quando as tropas de Frederico II, Rei Alemão e Imperador do Sacro Império Romano, estavam devastando o vale do Espoleto, onde está situada a cidade de Assis, os soldados, preparando-se para entrar na cidade, começavam à noite a escalar as paredes do Convento de São Damião. Alertada pelas irmãs, Clara, como superiora do Convento, apesar de adoentada, levantou-se de sua cama, apanhou o ostensório na pequena capela ao lado de sua cela e foi até uma janela que havia em uma parede por onde os invasores já subiam por uma escada. Diz a tradição que, quando ela elevou o ostensório ao alto em oração, pedindo a Deus proteção para suas irmãs, já que ela, doente, não se sentia em condição de ajudar, os soldados teriam recuado estarrecidos e se posto em debandada para não mais voltar.

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Que curioso paralelo com o ataque ao Convento da Lapa, quase 600 anos mais tarde! Na Idade Média, a Abadessa Clara, sentindo o corpo fraco, elevou a vibração da alma a altura tão grande que colocou os atacantes para correr. Em nosso Brasil, prestes a se tornar independente, a Abadessa Joana Angélica, sentindo o corpo forte, coloca-se à frente dos soldados e enfrenta a morte do corpo com bravura e consciente da prática do bem.

Paralelos sempre nos colocam a pensar. Terá o personagem que Joanna animou na Idade Média sido a própria Clara? Terá sido uma irmã tão próxima de Clara que, tendo assistido a tudo o que ocorreu em São Damião, teria tido a cena heróica marcada em seu psiquismo como grata lembrança a emular?

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Na defesa dos nossos semelhantes frente às injustiças e agressões, devemos ser destemidos e imbuídos de fé, na certeza de que estamos a seguir os ensinamentos de Jesus exemplificados por Clara de Assis e Joana Angélica. Se nossa condição física não nos garantir sucesso na empreitada, os bons Espíritos estarão lá, prontos e dispostos a ajudar.

Se nossa fé não é tão intensa a ponto de afugentar os agressores, se nossa coragem não é tão grande a ponto de colocarmos nosso corpo entre eles e aqueles a quem desejam ferir, que façamos, pelo menos, o melhor que nossas limitações nos permitem.
Fiquemos do lado de quem está do lado do bem, apoiemos as iniciativas nobres em defesa dos fracos e oprimidos.

Caso sejamos ainda menores e medrosos, se ainda não nos sentirmos sequer capazes de apoiar quem luta para proteger nossos irmãos das injustiças e agressões, que pelo menos não as cometamos nós, nem estejamos do lado de quem as pratica.
Se Joanna foi Clara de Assis, Por Que não o Revela?

Se observarmos com atenção, das poucas existências reveladas por Joanna, nenhum dos personagens que ela animou contém grande séqüito de devotos. Sóror Juana Inés de la Cruz é muito respeitada pelas suas obras e por sua postura de vida, mas aqueles que a admiram não têm por ela devoção religiosa. Os que admiram a Abadessa Joana Angélica vêm nela uma heroína de nossa Independência e não uma Santa. Joana de Cusa é distante no tempo e cultuada como santa pela Igreja Ortodoxa Grega, sendo pouco conhecida no Ocidente, onde seu nome não consta nas listas de santos católicos mais populares, mas apenas nas completas, onde aparece como Santa Joana. Clara de Assis, por outro lado, é uma santa com inúmeros devotos no Ocidente, além de ter uma Ordem religiosa que leva seu nome.

Se afirmasse ter sido Clara de Assis, Joanna estaria mexendo com os sentimentos de inúmeros devotos da santa, ensejando, por parte dos mais radicais, agressões que nenhum bem fariam ao movimento espírita ou a quem quer que fosse. Perturbar os outros e causar desgastes sem propósito são atitudes que Joanna nunca teve em sua longa missão junto a nós. Logo, por que haveria de fazê-lo neste caso? Não esperemos, pois, que Joanna nos diga ter sido Clara naquela distante existência.
Lembremos que o próprio Mestre Jesus declinou de identificar-se com precisão por ocasião da Codificação Espírita, usando o epíteto de Espírito de Verdade. Com isso, queria Jesus evitar desgaste desnecessário ao processo de divulgação da Doutrina, pois os Católicos ficariam revoltados a extremos ainda maiores do que ficaram.

Nos ocorre, no entanto, que, se Joanna tivesse sido uma irmã próxima a Clara e não a própria, as justificativas que existem para a não revelação do nome que ela teve não persistiriam. E, apesar disso, Joanna tampouco informou qual dentre as irmãs Clarissas corresponderia à personalidade que animou naquela vida. Existem, portanto, a nosso ver, fortes evidências sugerindo que Clara de Assis tenha sido um dos personagens vivido por Joanna de Ângelis.

Em respeito à discrição de Joanna não devemos alardear nossas hipóteses, por mais sustentadas que elas nos pareçam. No âmbito deste estudo, entretanto, entendemos que tal questão não poderia deixar de merecer nossa atenção.

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Fica-nos mais uma lição. De que vale uma revelação se ela trouxer perturbação a alguns e nenhum bem fizer aos demais? Jesus e os grandes mensageiros da humanidade causaram cizânia e contendas de toda natureza mas lograram, ao final de tais desencontros, legar uma mensagem de luz e paz à humanidade, mensagem esta que aos poucos se revela e vai sendo aceita pelo mundo. Por outro lado, que saldo positivo traria a revelação que estamos abordando? A nosso ver, nenhum. Ora, se o que temos a dizer nenhum bem traz e causa perturbação a alguém, por mais humilde e ignorado que seja esse alguém, é sempre melhor que nos calemos.


Na Equipe do Espírito de Verdade

Em sua obra Após a Tempestade, Joanna de Ângelis revelou ter participado da equipe do Espírito de Verdade quando da Codificação de nossa amada Doutrina.

Fiel discípula de primeira hora, não poderia Joanna omitir-se em tarefa tão nobre capitaneada pelo seu amado Mestre Jesus.

Em seus primeiros contatos com Divaldo, Joanna declinou de informar seu nome, identificando-se como “Um Espírito Amigo”. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, há duas mensagens assinadas por “Um Espírito Amigo”, uma no Cap. IX, item 7 e outra no Cap. XVIII, itens 13 a 15. A identidade da designação sugere tratarem-se da mesma entidade.

São ambas mensagens inspiradas e altamente educativas. Vamos, no entanto, citar apenas uma parte da primeira, por tocar em um ponto por nós comentado mais acima. Trata-se do segundo parágrafo da mensagem intitulada A Paciência.

“Sede pacientes. A paciência também é uma caridade e deveis praticar a lei de caridade ensinada pelo Cristo, enviado de Deus. A caridade que consiste na esmola dada aos pobres é a mais fácil de todas. Outra há, porém, muito mais penosa e, conseguintemente, muito mais meritória: a de perdoarmos aos que Deus colocou em nosso caminho para serem instrumentos do nosso sofrer e para nos porem à prova a paciência.”

Lembremos, neste instante, das últimas palavras que Joana de Cusa dirigiu a seu algoz, quando perguntada por ele se o Cristo a havia somente ensinado a morrer:

- Não apenas a morrer, mas também a vos amar!...

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Nota: Os autores divergem quanto ao ano do nascimento de Juana de Asbaje, o que compromete toda a cronologia posterior. Adotamos, neste trabalho, o ano de 1651, que é o que consta mais freqüentemente em suas biografias disponíveis na Web.


Bibliografia

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Franco, Divaldo P. Jesus e o Evangelho – À Luz da Psicologia Profunda. Ditado pelo Espírito Joanna de Ângelis. LEAL. Salvador, 2000.

Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 112 Ed. FEB. Rio de Janeiro, 1996.
Paz, Octavio. Sor Juana Inés de la Cruz o Las Trampas de la Fé. 3 Ed. Fondo de Cultura Económica. México, 1985.

Santos, Celeste e Franco, Divaldo P. A Veneranda Joanna de Ângelis. 6 Ed. LEAL. Salvador, 1998.

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Sor Juana Inés de la Cruz. Obtido, em Dezembro de 2003, de http://www.uni-mainz.de/~lustig/texte/antologia/sorjuana.htm

Sor Juana Inés de la Cruz. Rincón Literário-Escritores. Valavanera.com. Obtido, em Dezembro de 2002, de http://www.valvanera.com/rinconlit/sjicruz.htm
Sóror Joana Angélica de Jesus. Boletim do GEAE no 188, de 14 de maio de 1996. Obtido de http://www.geae.inf.br, em Dezembro de 2003.

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The Sor Juana Inés de la Cruz Project. The Department of Spanish and Portuguese. Dartmouth College. Hanover, New Hampshire. Obtido, em Dezembro de 2003, de http://www.dartmouth.edu/~sorjuana/

(Estudo apresentado originalmente na Subsede da Instituição Espírita Joanna de Ângelis no dia 11 de Dezembro de 2003, data do 242º Aniversário de nascimento de Sóror Joana Angélica de Jesus)

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